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Tratamento da sobrecarga de ferro - quelantes

Considerações iniciais

A sobrecarga de ferro secundária normalmente ocorre em pessoas com distúrbios que prejudicam a produção de glóbulos vermelhos, tais como:

  • Distúrbios hereditários da estrutura ou da função da hemoglobina (como, por exemplo, anemia falciforme, talassemia ou anemias sideroblásticas);
  • Distúrbios que causam ruptura anormal de glóbulos vermelhos (anemias hemolíticas que estão presentes desde o nascimento, tais como esferocitose hereditária ou deficiência de piruvato quinase;
  • Distúrbios causados pela má formação dos glóbulos vermelhos (mielodisplasia)

Em tais distúrbios, às vezes, o organismo eleva a quantidade de ferro que absorve. Contudo, o organismo nem sempre pode usar todo o ferro devido à dificuldade de produzir novos glóbulos vermelhos. Em tais casos, pode ocorrer sobrecarga de ferro.

O ferro pode se acumular no organismo quando as pessoas ingerem ferro demais a partir de:

  • Terapia à base de ferro administrada em quantidades excessivas ou por muito tempo;
  • Repetidas transfusões de sangue

 

A meta do tratamento é reduzir o teor de ferro do corpo. No caso de algumas pessoas, o tratamento é a remoção de sangue (flebotomia). Contudo, muitas pessoas com sobrecarga de ferro secundária também têm anemia. Uma vez que a flebotomia piora a anemia, essas pessoas recebem terapia quelante. A quelação de ferro pode ser administrada por via oral usando-se deferasirox ou deferiprona ou por uma infusão de deferoxamina, a qual pode ser administrada sob a pele (via subcutânea) ou em uma veia (via intravenosa). Às vezes, deferasirox e deferiprona podem ser administrados juntos.

 

 

Indicações 

a) Politransfundidos

Os pacientes com anemia crônica não ferropriva que requeiram transfusões sanguíneas regulares (mais de seis transfusões/ano) e apresentem uma das seguintes condições:

- ferritina sérica acima de 1.000 ng/mL;

- biópsia hepática com concentração de ferro acima de 3,2 mg/g de fígado seco; ou

- ressonância magnética por T2 com sobrecarga cardíaca ou hepática de ferro.

 

b) Hemocromatose hereditária

Em casos de hemocromatose hereditária, a quelação de ferro está indicada nas seguintes situações:

- pacientes com anemia de etiologia não ferropriva, com hemoglobina abaixo de 11 g/L;

- pacientes com hipotensão sintomática e intolerância a flebotomia; ou

- pacientes sem possibilidade de acesso venoso para realização de flebotomia.

 

 

c) Quelantes orais

Para uso dos quelantes utilizados por via oral devem, além desses critérios, ser observados também os seguintes:

- para deferiprona: pacientes com talassemia maior e impossibilidade de uso da desferroxamina por contraindicação, intolerância ou dificuldades de operacionalização;

- para deferasirox: pacientes com sobrecarga crônica de ferro devido a transfusões de sangue (hemossiderose transfusional) e impossibilidade de uso da desferroxamina por contraindicação, intolerância ou dificuldades de operacionalização.

 

Critérios de exclusão

- Geral

Os pacientes cuja doença de base (que motivou as transfusões e, consequentemente, a sobrecarga de ferro) esteja resolvida, não sendo mais necessária terapia transfusional. Nesses casos, a flebotomia deve ser a primeira opção de tratamento. Além disso, todos os que apresentem histórico de hipersensibilidade ao medicamento ou a algum componente da fórmula também não devem ser tratados com quelantes.

 

- Ao Desferrixamina

Não devem fazer uso de desferroxamina: pacientes com insuficiência renal crônica grave ou com depuração de creatinina endógena abaixo de 30 mL/min, exceto se em diálise.

 

- Ao Deferiprona

Não devem fazer uso de deferiprona:

- gestantes ou nutrizes;

- pacientes com idade abaixo de 6 anos; ou

- pacientes com história de agranulocitose ou neutropenia ou, ainda, que utilizem concomitantemente medicamento(s) que possa(m) causar essas condições.

 

- Ao Deferasirox

Não devem fazer uso de deferasirox:

- pacientes com depuração de cretinina abaixo de 40 mL/min ou creatinina sérica acima de duas vezes o limite superior da normalidade;

- gestantes ou nutrizes;

- pacientes com menos de 2 anos de idade;

- pacientes com proteinúria moderada e relação proteinúria/creatinúria acima de 0,5 mg/mg;

- pacientes com hepatite B ou C em atividade;

- pacientes com bloqueio atrioventricular grau II ou III, alargamento do segmento QT ou em uso de cardiotônicos; 

- pacientes com síndrome mielodisplásica de alto risco e pacientes com outras malignidades de origem hematopoética ou não, nos quais a baixa expectativa de vida não permita os benefícios da terapia quelante.

Pacientes com sobrecarga de ferro secundária

Pacientes que apresentam sobrecarga de ferro secundária e necessitam de terapia transfusional para manter níveis de hemoglobina adequados têm na terapia com quelante a única opção de tratamento.  

A desferroxamina é um quelante altamente específico que se liga ao ferro, permitindo assim sua fácil excreção na urina e na bile. As características farmacocinéticas obrigam ao desenvolvimento de esquemas de infusão contínua. Dos medicamentos em estudo, apenas a desferroxamina tem efeito benéfico comprovado sobre a morbimortalidade em longo prazo.

Em pacientes com talassemia maior, a desferroxamina aumenta a sobrevida nos pacientes com doença cardíaca, além de reduzir a concentração de ferro hepático e interromper o desenvolvimento de fibrose hepática, o que justifica seu uso. A infusão subcutânea noturna de desferroxamina deve resultar na excreção urinária de ferro de 20 mg a 50 mg por dia.

Pode-se minimizar o acúmulo de ferro adicional e reduzir os estoques de ferro se a taxa de transfusão puder ser mantida abaixo de quatro unidades por mês. Uma conduta alternativa para pacientes que já apresentam sobrecarga de ferro grave (com manifestações como arritmias cardíacas e insuficiência ventricular esquerda) ou não toleram a terapia subcutânea é a infusão contínua (24 horas/dia) por um cateter intravenoso.

Outra estratégia utilizada em adultos é a administração de 2.000 mg de concentrado de hemácias durante a transfusão

Quais são os efeitos colaterais comuns?

Alguns efeitos colaterais comuns dos quelantes de ferro incluem:

  • Náuseas e tonturas
  • Diarréia
  • Irritação na pele
  • Vômito
  • Problemas de visão e audição

Efeitos mais graves, como lesões renais ou hepáticas, podem ocorrer. Assim que o corpo se acostuma ao medicamento, os efeitos colaterais geralmente desaparecem. 

Ao tomar deferoxamina ou deferasirox, você deve:

  • Faça exames de visão e audição antes de iniciar o tratamento, com novos exames a cada 6 a 12 meses. Tanto a deferoxamina quanto o deferasirox podem causar danos aos olhos e ouvidos.
  • Evite tomar vitamina C, a menos que seja prescrito pelo seu médico. Sob orientação médica, a vitamina C pode ser adicionada posteriormente à terapia de quelação de ferro, o que pode melhorar os resultados em alguns pacientes. A vitamina C deve ser tomada apenas em doses moderadas, como 100 mg por dia.

 

 Fármacos

- Desferroxamina: frasco-ampola de 500 mg;

- Deferiprona: comprimidos de 500 mg;

- Deferasirox: comprimidos de 125, 250 e 500 mg.

 

 Esquemas de administração

Desferroxamina (Desferal®) 

Geralmente administrada por infusão subcutânea (sob a pele) usando uma pequena bomba portátil do tamanho de um CD player. A bomba é usada de 8 a 12 horas por dia, geralmente à noite, durante o sono. Muitos pacientes têm dificuldade em tomar deferoxamina devido à necessidade de carregar uma bomba consigo.

20-60 mg/kg/dia, em infusão subcutânea através de bomba de infusão, durante 8-24 horas.

- Dose inicial: 25 mg/kg/dia.

- Dose máxima: 60 mg/kg/dia.

- Esquema alternativo em adultos: 2.000 mg, por via intravenosa, durante transfusão de concentrado de hemácias.

- Apresentação : Sua principal apresentação comercial é em pó liofilizado para solução injetávelFrasco-ampola com 500 mg de mesilato de desferroxamina em pó liofilizado, acompanhado de uma ampola de 5 mL de diluente (água para injetáveis).

- Modo de administração : Após a reconstituição com o diluente, a solução de desferroxamina pode ser administrada por diferentes vias:

Subcutânea (SC): Frequentemente utilizada para a quelação crônica de ferro, geralmente por infusão lenta, usando uma bomba de infusão portátil durante várias horas (ex: 8 a 12 horas por dia, 5 a 7 vezes por semana).

Intravenosa (IV): Usada para condições agudas (como intoxicação por ferro) ou para alguns pacientes com sobrecarga crônica que não toleram a via subcutânea, administrada por infusão lenta.

Intramuscular (IM): Embora possível, é menos comum para uso crônico devido à dor e desconforto no local da injeção. Pode ser utilizada para doses iniciais em casos agudos, se a via IV não for acessível.


Deferiprona (Ferriprox ® )

Vem em forma de comprimido e é tomada 3 vezes ao dia. Geralmente é bem tolerada pelos pacientes, mas pode causar queda na contagem de glóbulos brancos, portanto, os pacientes precisam fazer exames de sangue semanalmente enquanto estiverem tomando este medicamento (os glóbulos brancos protegem contra infecções).

75 mg/kg/dia, divididos em três administrações, por via oral.

- Dose máxima: 100 mg/kg/dia.

- Apresentação: comprimidos (500 mg e 1000 mg) e solução oral (100 mg/ml). 

 

Cálculo da dose para 70 kg:

Dose diária total: 75 mg/kg/dia×70 kg=5250 mg/dia

Divisão da Dose (Exemplo em 3 tomadas):

Dose por tomada: 5250 mg/dia/3 tomadas=1750 mg por tomada

Prescrição:

Deferiprona 500 mg, comprimidos.

Tomar 3 comprimidos (1500 mg) pela manhã, 3 comprimidos (1500 mg) à tarde e 4 comprimidos (2000 mg) à noite.

Total: 10 comprimidos/dia (5000 mg/dia).

Deferasirox:

É um quelante de ferro mais recente, disponível em duas apresentações. Deferasirox não é recomendado para pessoas com SMD de alto risco.

1. Exjade ®

Formulação: Comprimidos dispersíveis (também chamados de comprimidos para suspensão oral).

Como usar: Esses comprimidos devem ser dissolvidos em água, suco de laranja ou suco de maçã antes de serem ingeridos. A dispersão forma uma suspensão oral que deve ser consumida imediatamente.

Vantagens: Pode ser uma opção para pacientes que têm dificuldade em engolir comprimidos inteiros, como crianças pequenas ou idosos.

Desvantagens: Sabor: Muitos pacientes relatam um sabor amargo ou desagradável, o que pode afetar a aderência ao tratamento.

Preparação: Requer um tempo de preparo e dissolução, o que pode ser inconveniente para alguns pacientes.

Administração: Deve ser tomado com o estômago vazio, pelo menos 30 minutos antes da refeição.

Dose : 20-40 mg/kg/dia

Apresentações de Exjade®: Exjade® está disponível em comprimidos dispersíveis nas dosagens de 125 mg, 250 mg e 500 mg.

Para um paciente de 70 kg: Dosagem para um Paciente de 70 kg - A dose inicial recomendada de Exjade® é de 20 mg/kg de peso corporal por dia, administrada uma vez ao dia. Portanto, 20 mg/kg/dia×70 kg=1400 mg/dia.

Para uma dose de 1400 mg, o médico precisaria combinar diferentes comprimidos (por exemplo, dois comprimidos de 500 mg + um de 250 mg + um de 125 mg, ou três de 500 mg que totalizaria 1500mg, etc.). A dose deve ser arredondada para o comprimido inteiro mais próximo disponível.

 

 

2. Jadenu® 

- Formulação: (Comprimidos Revestidos por Filme e Grânulos)

  • Comprimidos revestidos por filme: São comprimidos que podem ser engolidos inteiros com água.
  • Grânulos (Jadenu Sprinkle): Uma versão que pode ser polvilhada sobre alimentos macios (como purê de maçã ou iogurte) e ingerida imediatamente.

- Como usar:

  • Comprimidos revestidos: Engolir com água, com ou sem uma refeição leve.
  • Grânulos: Polvilhar sobre uma pequena quantidade de alimento macio e consumir imediatamente.
  • Vantagens: 

Conveniência: Mais fácil de tomar, especialmente os comprimidos revestidos que podem ser engolidos inteiros, sem necessidade de dissolução prévia.

Sabor: Geralmente mais bem aceito em termos de sabor, especialmente os comprimidos revestidos, pois o revestimento mascara o gosto.

Flexibilidade: Pode ser tomado com ou sem uma refeição leve, o que pode melhorar a aderência.

Biodisponibilidade: Os comprimidos revestidos de Jadenu têm uma biodisponibilidade (absorção) maior do que os comprimidos dispersíveis de Exjade. Isso significa que uma dose menor de Jadenu pode ser equivalente a uma dose maior de Exjade. As doses são ajustadas para essa diferença, então a eficácia é a mesma se a dose correta for administrada.

  • Desvantagens: Os grânulos ainda requerem mistura com alimentos.
  • Dose inicial : 14-28 mg/kg/dia (devido à maior biodisponibilidade)
  • Apresentações de Jadenu®: Jadenu® está disponível em comprimidos revestidos por filme nas dosagens de 90 mg, 180 mg e 360 mg. Também existe a formulação em grânulos (Jadenu® Sprinkle).
  • Exemplo de dose  se 14 mg/kg de peso corporal por dia, administrada uma vez ao dia. Para um paciente de 70 kg: 14 mg/kg/dia×70 kg=980 mg/dia.

Para uma dose de 980 mg, o médico precisaria combinar diferentes comprimidos (por exemplo, dois comprimidos de 360 mg + um comprimido de 180 mg = 900 mg, ou três comprimidos de 360 mg que totalizaria 1080mg e pode ser ajustado com base na resposta). A dose deve ser arredondada para o comprimido inteiro mais próximo disponível.