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Manejo da terapia antidiabética no DM2 e sem doença cardiorrenal

Considerações iniciais

O tratamento do diabetes tipo 2 (DM2) evoluiu de uma visão focada no controle da glicemia para uma abordagem ampla, abrangendo proteção cardiorrenal, controle da obesidade e intensificação oportuna do controle glicêmico, buscando reduzir complicações a longo prazo. É essencial para a prevenção de complicações micro e macrovasculares.

Grandes ensaios clínicos randomizados (UKPDS, ADVANCE) mostraram a eficácia da redução sustentada da hemoglobina glicada (HbA1c) para abaixo de 7% em desfechos microvasculares, como retinopatia, doença renal e neuropatia. A redução de complicações macrovasculares, por sua vez, ocorre a longo prazo, e é mais evidente quando o controle glicêmico é iniciado mais precocemente, ainda no primeiro ano após o diagnóstico.

De acordo com o estudo UKPDS, cada 1% de redução na HbA1c leva a uma redução de risco de 14% de infarto agudo do miocárdio (IAM) e de 12% em acidentes vasculares cerebrais fatais e não fatais (AVC). Os benefícios cardiovasculares (CV) e renais relacionados ao uso dos inibidores do SGLT2 (iSGLT2) e dos agonistas do receptor do GLP-1 (AR GLP-1) abriram uma nova frente de tratamento de pessoas com DM2 com alto risco cardiorrenal. Reduções de 10% em eventos CV com os iSGLT2 e de 14% com os AR GLP-1 são obtidas em pacientes de alto risco. Estas se estendem a subgrupos com ou sem história de eventos CV prévios. Em face a estes benefícios, o uso destas duas classes (aqui chamadas de antidiabéticos de 1ª linha – AD1) passa a ser preconizado para pacientes de alto risco com DM2, independentemente do nível de HbA1c.

Outro ponto importante para o tratamento do DM2 é o foco no controle do peso corporal. A obesidade está associada a piores desfechos relacionados ao diabetes, à piora do controle glicêmico e à maior mortalidade. Por outro lado, a redução do peso corporal em pessoas obesas ou com sobrepeso está associada à melhora do controle glicêmico, aumenta a chance de remissão do DM2 e reduz a incidência de complicações microvasculares. A redução do excesso de peso deve, portanto, ser um objetivo permanente em todas as fases do tratamento do DM2.   

 

Estratégias de tratamento

O tratamento da hiperglicemia no paciente com DM2, tendo o foco para no manejo da terapia antidiabética em pacientes sem doença cardiorrenal ou com doença cardiovascular aterosclerótica (DCVA) tem recomendação que todos os adultos com DM2 sejam avaliados quanto ao risco CV antes de definir a estratégia de uso dos agentes antidiabéticos. A avaliação do risco CV é essencial para definir o tratamento antidiabético mais adequado. O risco de eventos CV em 10 anos na população com diabetes tipo 2 é, em média, duas vezes maior em comparação com a população da mesma idade sem diabetes. No entanto,  o risco individual varia com a idade, sexo, número de fatores de risco, a função renal, presença de DCV subclínica e história de eventos CV prévios, incluindo IAM, AVC ou qualquer revascularização.  

Abordagens não farmacológicas, como intervenção nutricional com foco no controle do peso, exercícios físicos, diminuição do tempo sentado, melhora da duração do sono, cessação do tabagismo e controle do estresse são recomendadas durante todas as fases do tratamento no DM2 para melhorar o controle glicêmico.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

A escolha desses agentes deve ser individualizada, considerando aspectos como a estratificação de risco CV, o IMC e a taxa de filtração glomerular, de acordo com as recomendações descritas a seguir. Adicionalmente, devem ser considerados aspectos como eficácia, risco de hipoglicemia, tolerabilidade, custo, potenciais efeitos adversos e a preferência do paciente. 

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Classes de medicamentos antidiabéticos disponíveis no Brasil.

  • Biguanidas
  • Sulfonilureias
  • Inibidores do SGLT2
  • Inibidores da DPP-4
  • Agonistas do Receptor do GLP-1
  • Coagonistas do receptor de GIP/GLP-1
  • Glitazonas (Tiazolinedionas)
  • Inibidores da alfa-glicosidase

 

Manejo da terapia antidiabética no DM2 - (Combinações de Antidiabéticos)

Metformina e iDPP-4

Metformina 500/850/1000mg + Sitagliptina 50mg  JANUMET

Metformina XR 500/1000mg + Sitagliptina 50mg  JANUMET XR
Metformina XR 500/1000mg + Sitagliptina 100mg   JANUMET XR

Metformina XR 500/1000mg + Vildagliptina 50mg   GALVUS MET XR

Metformina XR 500/1000mg + Saxagliptina 2,5 a 5mg KOMBIGLYZE XR

Metformina XR 500/1000mg + Linagliptina 2,5mg TRAYENTA DUO

Metformina XR 500/1000mg + Alogliptina 2,5mg   NESINA MET

 

Metformina e Sulfonilureias 

Metformina XR 500 + Gliclazida 30mg 500/30   GLIVANC

 

Pioglitazona e iDDP-4 

Pioglitazona 15/30mg + Alogliptina 25mg  NESINA PIO

 

Metformina + iSGLT2 

Metformina XR 1000 + Dapagliflozina 10mg   XIGDUO XR

 

iSGLT2 e iDPP-4 

Empagliflozina 10 ou 25mg + Linagliptina  GLYXAMBI

Dapagliflozina 10mg + Saxagliptina  QTERN

RECOMENDAÇÕES SOBRE O TRATAMENTO INICIAL DE PACIENTE COM RISCO CV BAIXO OU INTERMEDIÁRIO

Metformina

 Em adultos recentemente diagnosticados com DM2, assintomáticos, sem doença cardiorrenal e com risco CV baixo ou intermediário, nos quais a HbA1c está entre 6,5-7,5%, a metformina É RECOMENDADA para melhora do controle glicêmico, redução da progressão do diabetes e prevenção de complicações relacionadas ao diabetes. A metformina é altamente eficaz na redução da hiperglicemia, é bem tolerada, barata e segura, e pode retardar a progressão natural do DM2, ao mesmo tempo que reduz os desfechos relacionados ao diabetes. No entanto, o papel da metformina na redução dos eventos CV não é claro.

Ajuste da metformina de acordo com a função renal

  • A dose da metformina deve ser reduzida em 50%, (não ultrapassando 1 g ao dia), quando a taxa de filtração glomerular estimada estiver entre 30-45 mL/min/1,73 m² .
  • A metformina deve ser interrompida se a TFGe estiver abaixo de 30 mL/min/1,73 m², devido ao maior risco de acidose lática.

 Vitamina B12  - Os níveis de vitamina B12 deverão ser avaliados anualmente após 4 anos de início da metformina, e repostos, se necessário, em função do risco de deficiência de B12 associado ao uso dessa medicação.

 

Metformina + AD1 ou AD. 

Em adultos com DM2 assintomáticos, sem tratamento prévio, com risco CV baixo ou intermediário, nos quais a HbA1c está acima de 7,5%, a terapia dupla inicial com metformina associada a um segundo AD1 ou AD É RECOMENDADA para melhora do controle glicêmico. A terapia dupla com metformina e qualquer outro antidiabético foi sempre superior à monoterapia com metformina para redução da HbA1c.

 Risco de hipoglicemia - O potencial risco de hipoglicemia deve ser sempre considerado ao associar um segundo agente, se este for um secretagogo de insulina glicose-independente, especialmente quando a HbA1c estiver próxima de 7,5%.

 

Sulfoniluréias

As SU estão sabidamente associadas ao aumento da incidência de episódios de hipoglicemia.  Os resultados mostraram maior incidência de hipoglicemia para as SU em relação às demais medicações, por outro lado, o risco relativo de hipoglicemia entre as SU foi menor para a gliclazida, com a gliclazida MR associada a menor risco de hipoglicemia.  A SBD considera, portanto, que o uso de SU, especialmente as de segunda geração, é seguro em relação ao risco CV, mas o maior risco de hipoglicemia deve ser sempre considerado em relação à situação clínica específica de cada paciente. No caso de opção pelo uso de uma SU, as de segunda geração, como a gliclazida MR e a glimepirida, têm preferência pelo seu menor potencial para causar episódios de hipoglicemia.

 

Em adultos assintomáticos com DM2, sem tratamento prévio, de risco CV baixo ou intermediário, nos quais a HbA1c está de 7,5% a 9%,  ou acima de 9%:

a terapia tripla, incluindo metformina e dois AD1 ou AD, PODE SER CONSIDERADA para melhorar o controle glicêmico.  Além disso, a maioria dos estudos indica uma eficácia superior na redução da HbA1c com a terapia tripla, quando comparada a terapia dupla. Portanto, é provável que pacientes com HbA1c próxima de 9% sejam potenciais candidatos à terapia tripla inicial. Considerando a terapia tripla com uma combinação de metformina + iSGLT2 e AR GLP-1.

 

Em adultos com DM2, assintomáticos e sem tratamento prévio, nos quais a HbA1c está acima de 9%:

A metformina associada à terapia baseada em insulina PODE SER CONSIDERADA para melhorar o controle glicêmico. Em comparação com os agentes orais, a terapia intensiva com insulina precoce em pacientes com DM2 recém-diagnosticada está associada a impacto favorável na recuperação e manutenção da função das células β pancreáticas, bem como à remissão glicêmica prolongada..

 

Em adultos com DM2 de inicio recente, com HbA1c acima de 9% e sinais e sintomas de hiperglicemia (poliúria, polidipsia, perda de peso)

a terapia à base de insulina É RECOMENDADA para melhora do controle glicêmico. A SBD recomenda o uso de terapia baseada em insulina em pacientes com DM2 com sintomas de hiperglicemia. Esta recomendação é baseada principalmente na fisiopatologia do DM2, na plausibilidade e na experiência clínica, já referida em diretrizes anteriores.

O uso de insulina no DM2 está recomendado preferencialmente em pacientes sintomáticos, nas situações clínicas agudas e durante internação hospitalar. O seu uso poderá ser revisto após o tratamento agudo inicial, podendo ser substituído por uma terapia dupla ou tripla.

 

 

RECOMENDAÇÕES SOBRE A INTENSIFICAÇÃO DO TRATAMENTO DE PACIENTE COM RISCO CV BAIXO OU INTERMEDIÁRIO

- Em adultos com DM2 e sem complicações cardiorrenais, cuja HbA1c permanece acima do alvo apesar da terapia dupla, a terapia tripla É RECOMENDADA para melhorar o controle glicêmico.

- Em adultos com DM2 sem complicações cardiorrenais, cuja HbA1c permanece acima do alvo apesar da terapia tripla, a terapia quádrupla É RECOMENDADA para melhorar o controle glicêmico. Portanto, a terapia quádrupla com metformina, uma sulfonilureia, um iDPP-4 e iSGLT2 pode ser considerada eficaz e segura para o tratamento do DM2.

- Em adultos com DM2 cuja HbA1c permanece acima do alvo apesar da terapia quádrupla, a adição de terapia à base de insulina É RECOMENDADA para melhorar o controle glicêmico.

- Em adultos com DM2 que necessitam de terapia baseada em insulina, uma coformulação de proporção fixa de insulina/AR GLP-1  DEVE SER CONSIDERADA para melhorar o controle da glicose, minimizando o ganho de peso.

 

RECOMENDAÇÕES SOBRE O TRATAMENTO DO DIABETES EM PACIENTE COM SOBREPESO OU OBESIDADE

R13. Em adultos com DM2 e IMC entre 27-29,9 kg/m², os AR GLP-1 e os coagonistas do receptor de GIP/GLP-1 DEVEM SER CONSIDERADOS para redução de peso corporal, independentemente do risco CV.

 R14. Em adultos com DM2 e obesidade, os AR GLP-1 e os coagonistas do receptor de GIP/GLP-1 SÃO RECOMENDADOS para redução de peso corporal, independentemente do risco CV.

R15. Em adultos com DM2, obesidade e HbA1c acima de 9%, sem sinais ou sintomas graves de hiperglicemia, uma combinação de insulina basal e AR GLP-1 PODE SER CONSIDERADA para melhorar o controle glicêmico.

 RECOMENDAÇÕES SOBRE O TRATAMENTO INICIAL DE PACIENTES COM ALTO RISCO CV

R16. Em adultos com DM2 e risco CV alto ou muito alto, o uso de um iSGLT2 ou de um AR GLP-1 , com comprovado benefício CV (AD1), É RECOMENDADO para redução de eventos CV independentemente da HbA1c.

 MANEJO DA TERAPIA ANTIDIABÉTICA NO DM2 COM DCV ATEROSCLERÓTICA ESTABELECIDA

  • A Figura 4 retrata o manejo da terapia antidiabética em adultos com DM2 e DCV aterosclerótica.

RECOMENDAÇÕES SOBRE O TRATAMENTO DO DIABETES EM PACIENTE COM SOBREPESO OU OBESIDADE

- Em adultos com DM2 e IMC entre 27-29,9 kg/m², os AR GLP-1 e os coagonistas do receptor de GIP/GLP-1 DEVEM SER CONSIDERADOS para redução de peso corporal, independentemente do risco CV.

- Em adultos com DM2 e obesidade, os AR GLP-1 e os coagonistas do receptor de GIP/GLP-1 SÃO RECOMENDADOS para redução de peso corporal, independentemente do risco CV.

- Em adultos com DM2, obesidade e HbA1c acima de 9%, sem sinais ou sintomas graves de hiperglicemia, uma combinação de insulina basal e AR GLP-1 PODE SER CONSIDERADA para melhorar o controle glicêmico.

 

RECOMENDAÇÕES SOBRE O TRATAMENTO INICIAL DE PACIENTES COM ALTO RISCO CV

- Em adultos com DM2 e risco CV alto ou muito alto, o uso de um iSGLT2 ou de um AR GLP-1 , com comprovado benefício CV (AD1), É RECOMENDADO para redução de eventos CV independentemente da HbA1c. 

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MANEJO DA TERAPIA ANTIDIABÉTICA NO DM2 COM DCV ATEROSCLERÓTICA ESTABELECIDA

- Em adultos com DM2 com DCV estabelecida, os iSGLT2 e os AR GLP-1 (AD1) SÃO RECOMENDADOS para reduzir eventos CV e mortalidade CV.  O iSGLT2 reduz a incidência de eventos CV e de mortalidade CV em pessoas com DM2 e alto risco: CV.

Observação de cautela: os pacientes tratados com canagliflozina tiveram um risco maior de amputação principalmente ao nível do dedo do pé ou metatarso;  as taxas de complicações da retinopatia (hemorragia vítrea, cegueira ou condições que requerem tratamento com um agente intravítreo ou fotocoagulação) foram significativamente mais altas  naqueles que receberam semaglutida injetável. Esses eventos adversos são novas descobertas cujos mecanismos são desconhecidos. Portanto, esta diretriz recomenda cautela no uso de canagliflozina em pacientes com risco de amputação e semaglutida injetável naqueles com retinopatia proliferativa.

- Em adultos com DM2 e DCVA já em uso de um iSGLT2 ou de um AR GLP-1, a combinação de ambos os AD1 PODE SER CONSIDERADA, por estar associada a um menor número de eventos CV e à diminuição da mortalidade por todas as causas. 

- Em adultos com DM2 e DCVA, que usam iSGLT2 ou AR GLP-1 e cuja HbA1c permanece acima do alvo, a terapia dupla com AD1 e metformina É  RECOMENDADA para melhorar o controle glicêmico.   Embora não tenhamos estudos que avaliem o uso sequencial da metformina como terapia complementar à monoterapia com iSGLT2 ou AR GLP-1, há evidências mais que suficientes sobre o uso de AD1 como terapia complementar à metformina.

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RECOMENDAÇÕES SOBRE A INTENSIFICAÇÃO DO TRATAMENTO DE PACIENTES COM ALTO RISCO CV

- Em adultos com DM2, DCVA e HbA1c acima do alvo, apesar da terapia dupla, a terapia tripla pode ser feita com:

- metformina e dois AD1 (iSGLT2 e AR GLP-1) É RECOMENDADA para melhorar o controle glicêmico.

 - um AD (pioglitazona, SU de segunda geração ou iDPP-4) ou a terapia baseada em insulina com pelo menos um AD1 PODE SER CONSIDERADA para melhorar o controle glicêmico.

 

 Associação entre iSGLT2 e AR GLP-1

Embora, isoladamente, ambos iSGLT2 e AR GLP-1 tenham comprovado benefício CV, ainda não há evidências robustas da existência de um efeito aditivo na redução de eventos CV com essa combinação.

 

Fontes

https://diretriz.diabetes.org.br/manejo-da-terapia-antidiabetica-no-dm2/#ftoc-recomendacoes-sobre-a-intensificacao-do-tratamento-de-pacientes-com-alto-risco-cv